top of page
jorge.jpg
lincoln.jpg

Imaginar sem imagens: uma aproximação coletiva à arte de comunidade e processos sociais
-

Texto de Jorge Sepúlveda T., Guillermina Bustos e Lola Fabres

Publicação: Texto publicado no livro Experiencias de Arte y Comunidad / Residencia de Arte Contemporáneo y Procesos Sociales / Lincoln / 2016, editado por Jorge Sepúlveda T., Guillermina Bustos e Paola Fabres, através de Curatoría Forense, em 2017, com o apoio da Secretaria de Cultura e Educação do Município de Lincoln. ISBN 978-987-28847-6-5

​

Notas

​

[1] Charles Bukowski. Borracho, cartero y poeta. / Bêbado, carteiro e poeta.

[2] Chico Buarque. O que será. 1976.

[3] Cfr. Farocki, Harun. Desconfiar de las imágenes. / Desconfie das imagens.
[4] Sepúlveda T., Jorge & Bustos, Guillermina. (2017) Residencias de Arte Contemporáneo SOCIAL SUMMER CAMP, Villa Alegre, Chile. (Córdoba: Editorial Curatoría Forense). p. 38.
[5] Ludwig Wittgenstein. Tractatus Logico-Philosophicus
[6] No sentido de Weltanschauung.

[7] Término propuesto por Ana Luisa Lima, durante una conversación en Uberbau_house (São Paulo, Brasil).
[8] Sepúlveda T., Jorge y Bustos, Guillermina. (2017). El Arte como herramienta para la acción política.
Artigo publicado en: http://www.curatoriaforense.net/niued/?p=2714

[9] Sepúlveda T., Jorge e Petroni, Ilze. (2013) Del objeto de arte a la relación de arte (contemporáneo).
Artículo publicado en: www.curatoriaforense.net/niued/?p=2062

"Precisamos de uma erĂłtica da imagem" (Susan Sontag, 1964) Contra a interpretação Nenhuma boa histĂłria começa com “estava eu lĂĄ, comendo uma salada, quando...” [1]. Nenhuma, por mais que tentemos. As boas histĂłrias tĂȘm uma dose de força, de fantasia delirante, uma impossibilidade constitutiva. As boas histĂłrias tĂȘm fome. Nossa histĂłria começa com um incĂŽmodo e com uma urgĂȘncia. Esse incĂŽmodo de saber-nos indivĂ­duos e de necessitarmos uma comunidade. De nĂŁo entender suficientemente o que nos Ă© prĂłprio e o que nos Ă© compartilhado. E sentimos essa urgĂȘncia de saber qual Ă© o nosso limite e qual Ă© a nossa posição. EntĂŁo enfrentamos trĂȘs tensĂ”es simultaneamente: a tensĂŁo do indivĂ­duo consigo mesmo, a tensĂŁo da comunidade e, terceiro, a tensĂŁo entre cada indivĂ­duo e a comunidade. Mas, diferente do que supĂ”e o senso comum, resolver a tensĂŁo Ă© a pior solução. Porque ela nĂŁo necessita de uma solução. Resolver a tensĂŁo nos objetifica (nos firma em nossas convicçÔes). Sustentar a tensĂŁo Ă© o que nos faz indivĂ­duos, nos obriga a negociar com a realidade. “viver juntos ou morrer sozinhos”. EntĂŁo. Cada indivĂ­duo oscila entre se afirmar e colocar-se vulnerĂĄvel. Entre ter a força de afetar e a capacidade de se deixar ser afetado. Porque na tensĂŁo entre esses impulsos, se um deles vence sobre o outro, ambos sĂŁo derrotados. Tomar partido, se afirmar nessa tensĂŁo, Ă© sempre problemĂĄtico e estressante porque os riscos para o indivĂ­duo sĂŁo muitos. Porque no intuito de se auto-afirmar pode-se negar a existĂȘncia da diferença (de todo o outro), tendo a ignorĂąncia auto induzida como base da sua convicção. O indivĂ­duo, quando elude qualquer argumentação (com o outro, em relação ao outro), destrĂłi com isso a comunidade e a polĂ­tica. Para evitar a homogeneização prescritiva, a ideia de “A pĂĄtria Ă© o outro” deve ser dimensionada como “a pĂĄtria Ă© a predisposição e a estruturação de toda a relação possĂ­vel”. NĂŁo basta reconhecer (ou tolerar) a existĂȘncia do outro, deve-se possibilitar que o outro nĂŁo seja mais um de si. Por sua vez, as comunidades estĂŁo organizadas por esse desejo de estabilidade, de estabilização. Esta pretensĂŁo muitas vezes Ă© oposta ao indivĂ­duo, mas Ă© sempre insuficiente para as pretensĂ”es dos que conformam a comunidade. Comunidade e indivĂ­duo se constroem e se exigem mutuamente. Se moldam inclusive em suas relaçÔes impensadas, automĂĄticas. Porque indivĂ­duos e comunidades sĂŁo excedentes (e sintomas) de organizaçÔes paradoxais das ideologias disponĂ­veis, que se esforçam para evitar a conversĂŁo da tensĂŁo em conflito. SerĂĄ, que serĂĄ? O que nĂŁo tem certeza nem nunca terĂĄ O que nĂŁo tem conserto nem nunca terĂĄ O que nĂŁo tem tamanho SerĂĄ, que serĂĄ? O que nĂŁo tem decĂȘncia nem nunca terĂĄ O que nĂŁo tem censura nem nunca terĂĄ O que nĂŁo faz sentido [2] Assim, a disjuntiva Liberdade ou Segurança? Depende das decisĂ”es que os indivĂ­duos tomam para formar o coletivo e das exigĂȘncias que o coletivo requer do indivĂ­duo para o seu pertencimento. É uma questĂŁo de normatividade (de ordem, mas nĂŁo necessariamente de controle) e tambĂ©m da forma como o desejo se executa. Precisamos aprender a conviver com a liberdade do outro, especialmente quando esta liberdade nĂŁo coincide com os nossos interesses. HĂĄ de se aprender a viver com o desejo mesmo quando o outro nĂŁo nos deseja. E hĂĄ que aprender a viver com a necessidade e a urgĂȘncia de construir capacidades que sĂŁo possĂ­veis apenas no corpo social. Caso contrĂĄrio, os corpos sĂŁo banais e as comunidades apenas acumulaçÔes. "Quem nĂŁo tem estratĂ©gia, faz parte da estratĂ©gia do outro" (JosĂ© RaĂșl Capablanca) E viemos propor que a arte contemporĂąnea nĂŁo tem nada a ver com as imagens. Nem com a estĂ©tica, nem com a poĂ©tica. Viemos tentar comprovĂĄ-la na execução prĂĄtica da Ă©tica e da polĂ­tica. Propomos uma arte contemporĂąnea com capacidade de reconhecer nas imagens as possibilidades do imaginĂĄrio. Propomos uma arte contemporĂąnea liberada de sua obrigação ilustrativa e iluminadora. Viemos desconfiar das imagens [3]... dessa organização estĂĄtica da percepção, que ilustra ou força o imaginĂĄrio, fazendo-o de refĂ©m. Porque foi dessa forma autoritĂĄria que, atravĂ©s da imagem, fomos criando um maquinĂĄrio de administração dos sĂ­mbolos com os quais nos vemos identificados e que nos obriga ao pertencimento e ao enraizamento. Aquele maquinĂĄrio Ă© uma estrutura prescritiva, que delimita previamente os saberes necessĂĄrios para a sua compreensĂŁo; que admite uma Ășnica leitura, que se impĂ”e e nos ordena. Que nos limita e nos posiciona. Viemos enfrentar os imaginĂĄrios... revisar “todo este repertĂłrio de noçÔes disponĂ­veis, a forma como se enlaçam, se afetam mutuamente e se organizam hierarquicamente, em que umas predominam e outras sustentam a sua narrativa” [4]; para evidenciar a maneira como dispĂ”em um esquema sobre os sujeitos, estruturando o verdadeiro, o possĂ­vel, o pensĂĄvel. Ao discutir os imaginĂĄrios fundamentados em imagens, instalados e naturalizados, se apresenta para nĂłs uma estrutura que nos indica que caminhos escolher, que variĂĄveis devem ser consideradas e, inclusive, decisĂ”es e preferĂȘncias que acreditamos ser nossas, individuais. Nos damos, entĂŁo conta, da pressĂŁo que esses imaginĂĄrios exercem sobre nĂłs. Te dĂĄs conta do labirinto quando Ă©s sucessivamente castigado. A Ășnica forma de escapar Ă© por cima. Enfrentamos imaginĂĄrios medĂ­ocres, vazios e normativos. MedĂ­ocres no sentido de ordenar narrativas com poucos elementos, com poucas e estereotipadas relaçÔes entre tais elementos. Vazios enquanto desprovidos de densidade e estruturação interna, superficiais, que atuam como denominaçÔes, nomes que sinalizam e esgotam no prĂłprio nome o que foi sinalizado. Normativos enquanto exigem o seu cumprimento para a eficiĂȘncia da comunicação, no entanto restringindo e inabilitando a capacidade de imaginar. Imaginar o outro, mas tambĂ©m outra versĂŁo de si mesmo. Desejamos encontrar maneiras de tornar visĂ­vel a decadĂȘncia de um imaginĂĄrio, e com isso a possibilidade de instalação de outro imaginĂĄrio, enquanto vamos desenvolvendo a capacidade de produzi-lo. Desejamos exibir quando demonstra sua mediocridade, atravĂ©s daquilo que nĂŁo pode explicar, quando exibe seu esvaziamento funcional ou, por Ășltimo, quando seu poder nĂŁo Ă© capaz de exercer força suficiente para coagir (nos). Pois quando hĂĄ coesĂŁo, a histĂłria romanceada (o relato dessa ordem) se instala facilmente. Demasiadamente fĂĄcil. Seus detalhes nos distraem e esquecemos que - por trĂĄs de cada anedota - persiste essa ordem. É aĂ­ que preferimos a sua ruĂ­na. "O sujeito nĂŁo fala, Ă© falado" (Cfr. Lacan, Jaques). Adiantamos que a arte contemporĂąnea se apropria dos imaginĂĄrios, esses que falam por nĂłs. Os revisa, instiga e questiona, mostrando como se contradizem e se sobrepĂ”e, formulando sobre eles formas de conhecimento abstrato que possibilitam a compreensĂŁo de seus processos estruturantes. Mas sua prioridade nĂŁo Ă© a denominação e sim os procedimentos que permitem sua existĂȘncia. Como? A arte contemporĂąnea Ă© uma ferramenta de conhecimento do real atravĂ©s de uma incompatibilidade da linguagem. NĂŁo sobre o que Ă© dito, mas sobre a possibilidade de dizer. Porque “os limites da minha linguagem sĂŁo os limites do mundo” [5]. EntĂŁo a pergunta se transforma em: de que maneira podemos forçar a linguagem a expandir ou adensar o que jĂĄ sabemos sobre o mundo? EntĂŁo afirmamos que aquilo do que fala a linguagem Ă© a superfĂ­cie. Por trĂĄs, estĂĄ a maneira como conhecemos, a estrutura Ă© invisĂ­vel aos olhos. NĂŁo importa qual Ă© a linguagem, nem qual sua letra ou sua composição visual, seu desenho ou o seu uso cotidiano. Afirmando e tomando distancia da alfabetização estĂĄ sua efetiva capacidade de conhecer. Delimitamos esta ĂĄrea em trĂȘs conceitos: processos cognitivos, viĂ©s cognitivo e dissonĂąncia cognitiva. Em resumo funk-sertanejo: como procedemos para aprender, o que decidimos nĂŁo aprender para poder aprender e, por Ășltimo, como se produz um aparente paradoxo entre duas concepçÔes de mundo [6] completamente diferentes que podem explicar a mesma coisa (suficientemente). Afirmamos que nossa forma e pretensĂŁo Ă© de que atravĂ©s da arte contemporĂąnea sejam desencadeados processos cognitivos, possibilitando a construção de outras organizaçÔes conceituais da cultura. Algumas sĂŁo revisionistas (contrastando a consistĂȘncia dos detalhes), outras estruturais (verificando como sĂŁo organizadas) e outras atualizadoras (que verificam sua obsolescĂȘncia ou pertinĂȘncia). Quando uma comunidade se liberta – mesmo que temporariamente – da hierarquia do visĂ­vel (e de seus representantes) provoca uma organização conceitual atualizante: atualiza colocando-os no presente, reorganizando o conhecimento e a experiĂȘncia, convertendo o que imaginamos em ação. Nos converte em ação e possibilidade. Neste sentido, a arte contemporĂąnea pode ser utilizada como ferramenta para auditar a cultura e verificar sua consistĂȘncia, facilitando a existĂȘncia de uma instĂąncia de confiança e exceção que habilita a dĂșvida. Mas sabemos que nem tudo que Ă© chamado de arte Ă© capaz de ser uma ferramenta. Por isso, parte do nosso trabalho exige que realizemos uma sĂ©rie de diferenciaçÔes fundamentais entre as prĂĄticas artĂ­sticas. Tem aquelas que atuam como mera semelhança casual, apenas como reiteração morfolĂłgica de uma obra ou manifestação anterior, esvaziando seu potencial crĂ­tico, tambĂ©m chamado de formalismo vulgar [7]. TambĂ©m tem as prĂĄticas de impostação ou reiteração, aparentemente crĂ­ticas, mas que se encontram mais prĂłximas da publicidade e da ilustração. E, por Ășltimo, encontramos as prĂĄticas que habilitam um uso polĂ­tico efetivo [8]. As duas primeiras (formalismo vulgar e prĂĄticas de impostação) propĂ”em uma relação passiva com o espectador, de contemplação e interpretação; em contrapartida, a terceira convida ao envolvimento atravĂ©s da utilização pragmĂĄtica do conhecimento disponibilizado pela arte contemporĂąnea. É tambĂ©m urgente entender e salientar a diferença entre as formas de incidĂȘncia pretendidas em relação Ă s comunidades com as quais se trabalha. Como mencionado, hĂĄ maneiras de a cultura produzir ajustes nos seus ordenamentos, manifestaçÔes nas quais suas normas sĂŁo revisadas e atualizadas. A diferença fundamental em relação Ă  arte contemporĂąnea Ă© que a cultura tende sempre Ă  coesĂŁo, a integrar este outro a sua estrutura homogeneizante. A arte contemporĂąnea Ă© uma ferramenta de conhecimento e visibilidade das tensĂ”es que atravessam as comunidades, instalando a incerteza e, atravĂ©s dela, a possibilidade de construir outras ordens. Ou seja, a arte contemporĂąnea atua a partir da dissidĂȘncia. A arte contemporĂąnea acontece como um fenĂŽmeno que irradia, onde seu suporte material Ă© meramente assessĂłrio. “... a arte contemporĂąnea tem o objeto unicamente como um excedente de suas prĂĄticas e processos. Isso nĂŁo quer dizer que nĂŁo haja objetos – que tenham desmaterializado em pura ideia – mas que os critĂ©rios para julgar jĂĄ nĂŁo pertencem a essa gama” [9]. Mais relevante que a sua materialização excedente (que a transforma em objeto, de estudo ou de arte) Ă© a sua existĂȘncia como fenĂŽmeno que habilita a relação que estabelecemos atravĂ©s de sua intermediação, que nos obriga, nos exige e nos reorganiza. Atuando como sujeitos da arte, nem automĂĄticos nem autĂŽmatos. CAPTCHA, mostra que - Ă s vezes – podes ser humano Por acaso os sujeitos existem? Por acaso sĂŁo possĂ­veis? Por acaso sĂŁo necessĂĄrios? Depois do declĂ­nio e da morte da trigĂȘmea francesa (Liberdade, Igualdade e Fraternidade) aquela ideia de sujeito se tornou obsoleta. Começamos a fazer parte de sociedades (e comunidades) nas quais a condição de sujeito Ă© meramente estatĂ­stica, de tendĂȘncia geral (#trending) que se especifica, de decisĂ”es previsĂ­veis da moda (entendida como repetição do mais provĂĄvel). Frente a isso sustentamos que ninguĂ©m sabe muito bem como ser um sujeito, como produzir, educar ou sequer se sabe quais as condiçÔes para reconhecer um. E qualquer tentativa (e que Paulo Freire nos perdoe) de estabelecer uma pedagogia voltada para o sujeito, termina em uma objetividade que objetifica sujeitos, que nos faz objeto. A pergunta segue sendo a mesma: Ă© possĂ­vel ensinar liberdade? ou colocado de outra forma: como se chega a ser o que se Ă©?. Diante disso propomos que a arte contemporĂąnea habilita instancias de subjetivação, permitindo abrir um jogo para essas decisĂ”es individuais que pretendemos livres. Isso a diferencia do design, da publicidade e do artesanato; Ă© isso que nos diferencia da homogeneização, da modulação e da vocação Ășnica do desejo, das suas satisfaçÔes e - atravĂ©s deles - de nĂłs mesmos que nos pretendemos sujeitos. É nesta influĂȘncia, ativa e efetiva, que os sujeitos sĂŁo possĂ­veis, polissĂȘmicos e desejantes, indecentes e vulnerĂĄveis. É aĂ­, bem aĂ­ que a arte contemporĂąnea exibe e exige uma reorganização das ordens culturais atravĂ©s da publicização de uma metodologia de conhecimento, incisĂŁo e fragmentação da subjetividade. Esta tensĂŁo entre sistemas (de ordem, ideolĂłgicos) explode nos indivĂ­duos, fazendo com que sejam possĂ­veis. Dado que nossa contrapartida Ă© a implantação do sistema, e nĂŁo sua ilustração ou sua imaginação, e suas formas de administração da diferença (atravĂ©s de sua polĂ­tica de manipulação ou sua emotividade superficial), Ă© que enfrentamos sempre o mesmo desafio: nosso trabalho Ă© quase invisĂ­vel para as comunidades e indiscernĂ­vel para os sujeitos (pelo modo como Ă© integrado e naturalizado). Quando o senso comum aprende, deshistoriciza, esquece a complexidade dos processos e se nega toda influencia que nĂŁo se converte em eficiĂȘncia, em didĂĄtica e pragmatismo. Nossa persistĂȘncia no trabalho nos tem ensinado nosso limite, nosso campo de ação e influĂȘncias efetivas. Assim, aprendemos que as revoluçÔes sĂŁo lentas e vĂŁo se instalando silenciosamente. A arte contemporĂąnea nĂŁo estĂĄ nas agendas polĂ­ticas, nas prioridades do orçamento ou no cotidiano do vizinho. A arte contemporĂąnea Ă© uma concatenação de açÔes e pretensĂ”es que nĂŁo sĂŁo visĂ­veis atĂ© a instalação de seus processos e procedimentos. Por isso, sabemos apenas aquilo que colocamos Ă  prova na ação. Lembramos apenas dos conhecimentos que utilizamos para tomar decisĂ”es e emitir julgamentos. EntĂŁo... saber sobre arte contemporĂąnea nos serve para quĂȘ? Para superar a esterilidade de ensinar a produzir imagens, de ensinar tĂ©cnicas ou de reproduzir o analfabetismo visual que se dĂĄ no seus sucedĂąneos... para discutir as prĂĄticas de arte que – em aparente rebeldia reacionĂĄria – buscam consentimento, aprovação e o pertencimento aparentemente alternativo. EntĂŁo, o que podemos fazer? Tentarmos nos aproximar, difusamente, de uma pedagogia que investiga o imaginĂĄrio. Nosso trabalho estĂĄ voltado ao compartilhamento de procedimentos que nos permitam perguntar-nos sobre o mundo. Pretendemos que a residĂȘncia seja uma instĂąncia na qual os participantes (artistas e vizinhos) sejam impulsionados a atuar politicamente a partir de suas individualidades e que nesta atuação individual desenvolva-se uma potencialidade: a habilidade de serem cidadĂŁos. Assim, buscamos conseguir com que as pessoas estejam habilitadas e atuem voluntariamente em uma zona coincidente entre os seus interesses e os da coletividade a qual pertencem. Isso nĂŁo acontece casualmente, Ă© necessĂĄrio que os artistas se desidentifiquem da posição hierĂĄrquica (de messias, de autor, de autoridade), escapando da pedagogia do embrutecimento. Para transformar uma economia de privilĂ©gios em uma economia de direitos. E frente cada nova relação, buscamos verificar quais sĂŁo seus condicionamentos formais ou estruturais que desejam reestabelecer as ordens das quais tentamos nos libertar: buscamos, entĂŁo, identificar a manipulação e a vitimização, suportar o desĂąnimo, o abandono e a indiferença, ao mesmo tempo em que buscamos evitar a caridade e a complacĂȘncia; seduzindo e motivando ao engajamento. EntĂŁo nosso trabalho de curadoria consiste em identificar as capacidades, habilitar seu uso conjunto e fazer com que estejam disponĂ­veis aos vizinhos. Começando por um diagnĂłstico, que se preocupe com a compreensĂŁo do contexto (e suas tensĂ”es) e tambĂ©m com o enfrentamento perante o que os vizinhos esperam e imaginam dos artistas. Trabalhar, discutir, combinar, e mantermo-nos juntos desde posiçÔes diferentes. Um diagnĂłstico, um plano e um programa; um modo de ser sujeitos e uma forma de conviver em comunidade. Buscamos manter a fome de devorar o mundo e usar a raiva para desejĂĄ-lo de outra maneira.

bottom of page